IMPOSTO SOBRE O PECADO: UMA BOA E VELHA IDEIA

IMPOSTO SOBRE O PECADO: UMA BOA E VELHA IDEIA

IMPOSTO SOBRE O PECADO UMA BOA E VELHA IDEIA

O “superministro” Paulo Guedes declarou no Fórum Econômico Mundial de Davos, que estudava a criação do que chamou de “imposto sobre o pecado”. A ideias seria aumentar a carga tributária incidente sobre alguns produtos como bebidas alcoólicas, cigarro e refrigerantes em razão da alta concentração de açúcar.

Com a exploração superficial do tema pela imprensa e sua rápida repercussão, o Presidente da República foi categórico ao negar qualquer possibilidade de encarecimento da “cervejinha”. Com isto, praticamente foi encerrado o debate nos veículos de comunicação e, também, nas mesas de bar. A interrupção desta importante discussão, além de prematura, não se baseou em evidências, tampouco em critérios econômicos sérios, de modo que é importante sua retomada.

O primeiro ponto que precisa ser esclarecido consiste na negação da surpresa. É que a tributação diferenciada de produtos que têm potencial de fazer mal à saúde de há muito já acontece no Brasil, através da adoção de alíquotas maiores de ICMS (imposto sobre circulação de mercadorias e serviços). Todavia, a tributação mais acentuada destes produtos faz parte do complexo e burocrático Sistema Tributário Nacional, ineficiente e injusto, que trava empresas (e, portanto, investimentos) e promove injustiças, corroborando com as desigualdades social e econômica.

Não por outra razão, o Congresso Nacional, ante a morosidade do Palácio do Planalto, se movimenta para levar adiante propostas de reformas tributárias. Com isto, iniciaram no Senado a tramitação da PEC 110/2019 e, na Câmara, a tramitação da PEC 45/2019. Ambas têm o escopo de promover reformas tributárias, apresentando semelhanças e diferenças. É de se destacar que nenhum das duas propostas tem potencial para resolver a questão das desigualdades – já que mantêm como pilar do sistema a tributação sobre a produção e a comercialização de bens e a prestação de serviços. Ou seja, ao continuar a priorizar a tributação do consumo, pobres e ricos continuarão a pagar os mesmos impostos, de sorte que, proporcionalmente, aqueles sofreram mais que estes.

Os projetos de reforma podem resolver, ao menos parcialmente, o outro grande problema do Sistema Tributário Nacional…

 Todavia, os projetos de reforma podem resolver, ao menos parcialmente, o outro grande problema do Sistema Tributário Nacional, qual seja sua complexidade e burocracia. É que ambos têm como principal objetivo a simplificação e racionalização da tributação dos bens e serviços, extinguindo diversos tributos para adoção de apenas dois: (a) o IBS (imposto sobre bens e serviços), conhecido como IVA (imposto sobe valor agregado) na maior parte dos países que o adotam; e (b) o IS (imposto seletivo), que seria específico e, portanto, incidira apenas sobre alguns bens e serviços.

O IS, portanto, seria justamente o “imposto sobre o pecado” aludido por Paulo Guedes e rechaçado por Jari Bolsonaro. Ou seja, ainda que o Presidente não goste do tributo, ele é contemplado pelas duas propostas de emenda à Constituição que tramitam nas casas legislativas, de modo que, se qualquer uma das duas for aprovada, o imposto será criado, já que emenda à Constituição independe de sanção presidencial. Sendo assim, a simpatia do Ministro da Economia ou a antipatia do Presidente da República ao tributo, formalmente, são pouco relevantes, porque a bola está com o Congresso Nacional.

Afora o aspecto formal, é preciso esclarecer que a ideia por trás do imposto também é positiva. Em primeiro lugar, se trata de mecanismo para, por decisão política, se ampliar a tributação sobre determinado bem ou serviço, sem corromper a ideia de simplificação e estabilidade do IBS, que seria a base do Sistema Tributário. Por outro lado, o IS permite maior equilíbrio nas finanças públicas aos desestimular o consumo de produtos que fazem mal à saúde e, portanto, implicam em mais custos para o Estado, sobretudo no que tange ao SUS.

Trata-se, portanto, de um importante instrumento de extrafiscalidade (intervenção do Estado no meio social e na economia), cuja arrecadação de receitas assume papel secundário, já que se dá mais importância ao impacto da medida na sociedade. É evidente que ao aplicar o IS (ou “imposto sobre o pecado”) às bebidas alcoólicas e açucaradas, bem como ao cigarro, é possível diminuir o consumo de tais produtos, reduzindo os impactos nefastos que causam na vida das pessoas. Para não ficar na obviedade das bebidas alcoólicas e do cigarro, cumpre destacar que os refrigerantes são um dos principais responsáveis pelos elevados índices de obesidade infantil do mundo, levando Holanda, Bélgica, Portugal, Reino Unido, Irlanda, Espanha, Estônia, Noruega e Turquia, por exemplo, a criar impostos seletivos para este tipo de bebida.

            Tudo isto demonstra que adoção deste tributo no Brasil, além de não ser uma ideia nova, é medida positiva, sobretudo quando se compreende que a tributação não é apenas mecanismo de arrecadação, mas também de mudança de comportamentos e para condução da sociedade a patamar mais elevado de civilidade e, sobretudo, de bem-estar. Se o caminho não é, nem precisa ser, o da proibição, o encarecimento no consumo de produtos nocivos à saúde é medida necessária para diminuir seus efeitos.

Dr. Pedro Sales

Advogado e professor

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